sábado, 30 de janeiro de 2010

Jornalistas acreditam que blogs podem pautar a imprensa

Izabela Vasconcelos, de São Paulo

Notícias exclusivas e assuntos diferenciados postados em blogs podem pautar a grande imprensa. É o que os jornalistas reunidos no painel "Jornalismo na rede", na Campus Party, acreditam. Um exemplo é o PEbodycount, blog sobre segurança público, mantido pelo jornalista Eduardo Machado e sua equipe, que retrata os índices de violência em Pernambuco. A página já chegou a pautar veículos e programas como Le Monde, Los Angeles Times, Profissão Repórter e Fantástico.

O blog apresenta números de homicídios e detalhes dos crimes que são atualizados diariamente. "A força disso é que quando o governo dizia que tinha tido um dia tranquilo, ou que a violência estava diminuindo, nós tínhamos esses dados para confrontar”, explica Machado.

O jornalista, que também é repórter do Jornal do Commercio de Pernambuco, conta que já rebateu uma informação oficial, de que uma das mortes registradas no estado teria sido causada por um atropelamento, saindo assim dos índices de criminalidade. Na realidade, os dados do blog, obtidos por fontes confiáveis, afirmavam que a pessoa havia sido morta a tiros. Para confrontar a informação oficial, os blogueiros postaram o texto “Atropelado por três tiros”, que gerou grande repercussão.

Para manter o blog, Machado conta com mais três profissionais na equipe e apoio da Associação do Ministério Público de Pernambuco (AMPE), que oferece R$ 1,5 mil de orçamento mensal para a manutenção da página.

Caminhos alternativos
Sem encontrar espaço nos grandes veículos ou patrocínio, muitos jornalistas optam por criar páginas independentes, como é o caso de Paulo Fehlauer, do blog garapa.org, coletivo multimídia, e André Deak, que mantém, ao lado de outros profissionais, o Haiti.org.br. No caso do portal sobre o Haiti, que é atualizado com informações gerais sobre o país, os jornalistas pretendem levantar uma verba para viajarem até o Haiti para cobrir o país de perto. Outra ideia é uma exposição com o trabalho dos principais fotógrafos que atuaram no Haiti.

Em todas essas investidas, os jornalistas não sabiam se teriam algum retorno ou não. “Nós sempre fizemos as coisas sem saber qual seria o retorno financeiro disso”, diz Fehlauer.

Nos blogs e sites alternativos, os profissionais acreditam que conseguem fazer o tipo de jornalismo que pretendem e investir nas reportagens multimídias, um grande diferencial. Deak só não entende porque os veículos brasileiros se afastam desse tipo de trabalho. “Os jornais do Brasil não valorizam a reportagem multimídia. É uma cegueira dos chefes de redação”.

Apesar de concordarem que o bom jornalismo custa caro, os profissionais criticam a cobrança de conteúdo na web. “Cobrar pelo conteúdo na internet é a vanguarda do atraso”, contesta Deak.

Exercício do jornalismo
Para exercer a profissão de jornalista, os palestrantes defenderam o fim da obrigatoriedade do diploma. Para eles, a faculdade é importante, mas não deve ser uma exigência para fazer jornalismo.

“Os melhores sites de economia são feitos por economistas. A faculdade é importante, mas é como no caso de publicidade, que é um curso aberto”, defendeu Marcelo Soares, jornalista profissional que escreve para o blog E você com isso?, da MTV.

Deak também é da mesma opinião. ”Os blogs nos mostraram que existe vida inteligente fora das redações”.

Maurício Stycer concorda e compara o trabalho de um blogueiro a de um jornalista. “Existem coisas que valem para qualquer mídia, como a apuração. São os princípios do bom jornalismo. A ideia do blog como ferramenta jornalística tem me fascinado”, declara.

sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

Mídia e FSM: uma novela em 10 capítulos

Michelle Prazeres - Observatório do Direito à Comunicação
29.01.2010

Mais uma edição do Fórum Social Mundial. Mais edições de jornais e revistas míopes. 10 anos depois, era de se esperar que a mídia conseguisse sair do seu cômodo lugar de simplificadora da realidade e compreendesse a complexidade do FSM? Não. Ainda bem, porque assim, não nos frustramos.


Dia 27 de janeiro, acordei para mais um dia de atividades do FSM Grande Porto Alegre. Depois do café, acompanhei a edição do jornal Bom dia Brasil, da Rede Globo. A manchete sobre o FSM é que o evento vive uma espécie de crise de identidade, esvaziado e sem propostas concretas.

Ora, o objetivo do FSM - nestes dez anos - foi construir um contraponto à visão de que a política é sinônimo de desenvolvimento econômico (numa menção direta ao Fórum de Davos), dar visibilidade às lutas e diversos movimentos e, por fim, articular estas lutas, promovendo uma sinergia, uma espécie de caldeirão, um espaço de processamento. Esta complexidade a mídia comercial nunca compreendeu. E sempre fez críticas ao FSM como espaço de “muita teoria e pouca prática”. Claro, um espaço que não se encaixa nas categorias cartesianas e que tem uma profundidade que o raso olhar da mídia privada não consegue alcançar. Um espaço da multiplicidade, da diversidade, da alteridade. Valores difíceis de a mídia estreita entender.

Um segundo ponto, em relação ao esvaziamento do evento, é - no mínimo - falta de informação. Este ano, ainda que Porto Alegre tenha concentrado um grande volume de atividades, o Fórum é descentralizado , e está acontecendo em mais de 27 grandes mobilizações ao redor do mundo. Ou seja, não se trata de um esvaziamento. Pelo contrário. O encontro em Porto Alegre, inclusive, superou as expectativas em termos de volume de público.

Por fim, durante o FSM, tive a oportunidade de acompanhar a cobertura da mídia gaúcha ao encontro na Região Metropolitana de Porto Alegre. Um olhar panorâmico pode nos fazer pensar que a mídia local é uma rara exceção. A cobertura é rica, diversa, aprofundada em muitos casos, plural, no sentido das vozes que a protagonizam. Sim, é fato que a cobertura é um exemplo do que poderia serem todos os demais meios. Mas é preciso ponderar que a mídia local tem um interesse direto na promoção de um evento que projetou Porto Alegre para o mundo e que traz inegavelmente uma movimentação econômica para a cidade.

Esta novela começou há dez anos. E a relação do FSM com a mídia comercial nunca terá um final feliz. Afinal de contas, faz tempo que os meios de comunicação deixaram de ser porta-vozes da elite, do poder e do mercado. Hoje, as empresas de comunicação integram este poder, se não são um dos maiores na correlação de forças global. Portanto, se o Fórum é um movimento contra-hegemônico, é um movimento “inimigo” da grande mídia.

Felizmente, o FSM vem amadurecendo - e muito - a sua concepção e comunicação e integrando esta dimensão à agenda do novo ciclo que se inicia rumo a Dakar, no ano que vem. Em 10 anos, de instrumento de divulgação, a comunicação avançou para eixo de debate e em seguida para direito a ser reivindicado pelos movimentos do campo do FSM (veja também: A comunicação nos dez anos do FSM).

Na mesa sobre sustentabilidade do Seminário Internacional que foi promovido em Porto Alegre estes cinco dias, foi bom ouvir que a comunicação deve ser encarada antes de tudo como um direito, mas também como um questão do entorno, da esfera pública, do ambiente que nos cerca. E que a revolução de que precisamos é fortemente marcada por uma dimensão comunicacional-cultural.

Se, cada vez mais, a plataforma FSM incorpora as questões por uma comunicação democrática e suas práticas internas mostram que as comunicações públicas, livres e alternativas são possíveis, até quando a grande mídia conseguirá condenar o Fórum a retaliações, omissões e invisibilidades? Como dizia a faixa das mulheres na marcha de abertura do FSM Grande Porto Alegre, “seguiremos em marcha até que todas estejamos livres”. Neste caso, até que todos/as tenhamos voz.

* Jornalista, mestre em Comunicação e Semiótica (PUC-SP) e doutoranda em Educação (FE-USP). Integrante do Intervozes e assessora de comunicação da ONG Ação Educativa. Autora do livro “Um Mundo de Mídia” (Ed. Global).

Comitê acusa Sabesp de ignorar alerta sobre níveis

Deu no Estadão de 29 de janeiro de 2009
Órgão de gestão do Sistema Cantareira diz ter pedido à estatal que fizesse descargas das represas em outubro
fonte: http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20100129/not_imp503413,0.php

O Comitê de Bacias dos Rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí (CB-PCJ), responsável pela gestão do Sistema Cantareira, afirma ter comunicado a Sabesp em 2 de outubro do ano passado sobre a necessidade de fazer descargas nos reservatórios. A reunião aconteceu em Capivari e os alertas foram registrados em ata e áudio, segundo o comitê, que gerencia o sistema e é ligado à Agência Nacional das Águas (ANA). Os técnicos da Câmara de Monitoramento Hidrológico do órgão chegaram à conclusão de que as comportas deveriam liberar água para os Rios Atibaia e Jaguari quando as barragens chegaram a 81%.

Com a capacidade de armazenamento esgotada, os dois reservatórios transbordaram na segunda-feira. Inundações causaram a saída de suas casas de milhares de pessoas de Atibaia, Piracaia, Bom Jesus dos Perdões e Bragança Paulista.

Desde setembro de 2004, técnicos fazem o monitoramento eletrônico e em tempo real do volume. O comitê é formado por ambientalistas, prefeitos e secretários de 60 municípios paulistas e 4 mineiros. No fim de setembro, foi feito o primeiro alerta à Sabesp, indicando que a previsão de chuvas para o verão deveria ser levada em conta. Em setembro, o sistema estava em 60% da capacidade.

Após as chuvas do início de outubro, os técnicos emitiram aos funcionários da Sabesp parecer favorável à abertura gradual das comportas. O nível de armazenamento chegara a 70%. "Mas eles (Sabesp) optaram por seguir as regras de seus próprios técnicos", afirma o coordenador do comitê, Astor Dias de Andrade.

A Sabesp argumenta que até o início de dezembro a situação era de "normalidade" e afirma não ter recebido o alerta. "Não recebi nenhum documento desse rapaz, nunca vi uma assinatura. Ele devia se preparar antes de falar besteira e fazer alarmismo", disse Paulo Massato, diretor metropolitano da Sabesp. "Em outubro e novembro, o nível do sistema estava em 50%, só foi começar a encher em dezembro. Como íamos descarregar água? Temos a responsabilidade de garantir o abastecimento de 22 milhões de pessoas." Reportagem publicada pelo Estado no dia 5 de novembro, indicava que o sistema estava em 80,6% de sua capacidade.

A situação do Cantareira será discutida em reunião hoje em Brasília, na ANA. "Queremos nos colocar à disposição para ajudar. Por isso, convocamos a Sabesp e o Daee (Departamento de Águas e Energia do Estado) para conversar", disse o presidente da agência, Vicente Andreu Guillo.

NOVA VAZÃO
Ontem, a Sabesp reduziu a vazão para os rios da Bacia do Piracicaba de 79 m³/s para 77 m³/s. Com novas chuvas à tarde, a água em áreas alagadas não baixou. Em Atibaia e Bragança, 1.200 famílias já foram removidas; outras 176 saíram de casa em Pedreira, Morungaba e Amparo

quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

OS ESPELHOS, O HORROR

Mídia à beira de um ataque de nervos
por Alberto Dines em 19/1/2010
no Observatório de Imprensa
A mídia brasileira está sendo vítima de um surto da síndrome do pânico: está com horror ao espelho. Berra e esperneia quando alguém menciona a organização de conferências ou debates públicos sobre meios de comunicação, imprensa, jornalismo. Apavora-se ao menor sinal de controvérsias a seu respeito, por mais úteis ou inócuas que sejam. Parece ter esquecido que o direito de ser informado é um dos direitos inalienáveis do cidadão contemporâneo. O Estado Democrático de Direito garante a liberdade de expressão e o acesso universal à informação.

A instituição criada para impedir unanimidades, o poder instituído para promover o pluralismo, o bastião do Estado Democrático de Direito, agora se sobressalta e entra em transe quando pressente outros holofotes tentando focalizá-lo.

Diagnóstico 1: modéstia. Diagnóstico 2: narcisismo. Diagnóstico 3: onipotência. Diagnóstico 4: hipocrisia.

Nada impositivo
O primeiro episódio ocorreu no início de dezembro, antes da 1ª Conferência Nacional de Comunicação (Confecom): o grosso das corporações empresariais de mídia desistiu de participar dos debates, compareceram apenas duas. As únicas que ficaram bem na fita. A Confecom chegou ao fim, produziu um calhamaço de propostas, a maioria inócuas, e os ausentes nem puderam cantar vitória porque se escafederam antes das luzes se apagarem (ver, neste OI, "Lições de manipulação" e "O misterioso e suspeito desaparecimento do Conselho de Comunicação Social").

Menos de um mês depois, final de dezembro, novo faniquito: o 3º Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH). A mídia inicialmente parecia sensível aos apelos das vítimas, parentes ou entidades em defesa dos direitos humanos para reabrir as investigações sobre a repressão política durante o regime militar. Então aparece a Associação Nacional de Jornais (ANJ) e começa a urrar como aquelas senhoras que pressentem uma barata no quarto escuro.

A mídia individualmente e a ANJ como corporação tiveram meses para estudar o 3º PNDH, esta é a sua função em nome da sociedade. Só se lembraram de examinar o documento quando o debate sobre tortura já estava aceso e alguém sugeriu abrandar o confronto e mudar o enfoque: que tal discutir a mídia? Então a mídia deu marcha a ré e entrou numa briga que não era sua porque no programa figurava a sugestão para a criação de um ranking das empresas de mídia (sobretudo mídia eletrônica) que respeitam os direitos do seu público e não lhes impinge baixarias. Convém lembrar que o PNDH é um programa, coleção de propostas, nada tem de mandatório ou impositivo.

O ombudsman da Folha de S.Paulo, Carlos Eduardo Lins da Silva, revoltou-se, caiu de pau no seu jornal (ver "Ombudsman critica omissão do jornal"). Acontece que a Folha, por rodízio, tornou-se a mais estridente defensora das posições da ANJ porque a sua presidente é uma das superintendentes do jornal.

Símbolos religiosos
É antiga a idéia de incluir a cruzada contra a baixaria televisiva nas iniciativas em defesa dos direitos humanos. Já em 1999, no primeiro mandato de FHC, o então Secretário Nacional de Direitos Humanos, José Gregori, tentou enquadrar os canais de TV que recusavam a classificação da programação por faixa etária (ver, neste Observatório, "Os fanáticos ensandecidos"). Então, por que tanto chilique?

O Estado de S.Paulo chegou a publicar uma entrevista com o professor Paulo Sérgio Pinheiro, consultor das Nações Unidas para questões de direitos humanos, na qual ele afirmava categoricamente que o 3º PNDH era herdeiro dos dois anteriores (produzidos nos mandatos de FHC) e que sua abrangência enquadrava-se nas recomendações e paradigmas internacionais.

A CNBB, campeã da luta contra a tortura ainda nos anos de chumbo, esqueceu o seu glorioso passado e pôs-se a berrar contra outras sugestões do 3º PNDH: liberar as restrições contra o aborto, permitir a união civil de pessoas do mesmo sexo e proibir a utilização de símbolos religiosos em instalações públicas. Mesmo sabendo que nada disso poderia ser implementado sem os devidos trâmites legislativos, a CNBB e a ANJ insistiram na histeria.

E ficaram todos muito felizes quando o salomônico presidente Lula mandou copidescar o texto do PNDH por ele assinado. Não se fala mais em direitos humanos nos próximos doze meses. Engano: a luta pelos direitos humanos não tem dono, está definitivamente incluída na pauta dos debates nacionais. Tortura não é coisa do passado, é do presente.

É melhor liberar o aborto do que encontrar diariamente nos lixões recém-nascidos abandonados por mães solteiras. A exibição de símbolos religiosos em repartições do Estado afronta aqueles que acreditam que o Estado é garantidor da isonomia cidadã, da democracia e da tolerância.

Causas e terapias
A síndrome do pânico voltou a manifestar-se intensamente no último fim de semana – e não por causa da catástrofe do Haiti –, quando o Estadão descobriu que em março começará uma nova conferência nacional, desta vez para discutir cultura. Deus nos acuda, horror. Cultura? Chamem o Goering! Na pauta menciona-se a necessidade de promover a regionalização da produção televisiva e aparece a expressão maldita "monopólio de comunicação".

Tremendo de medo, lívida, cheirando seus sais, Madame Mídia convocou o seu zorro preferido: o deputado Miro Teixeira (PDT-RJ, ex-ministro das Comunicações do atual governo, o mesmo que pediu a impugnação integral da Lei de Imprensa, esquecido de que algumas de suas cláusulas eram indispensáveis para evitar o vácuo legal). O herdeiro de Chagas Freitas, ex-colunista especializado em pedir votos aos funcionários públicos, desinteressado como sempre, investiu imediatamente em defesa da aterrorizada mídia negando a existência de qualquer monopólio nos meios de comunicação.

Qualé, seu Miro – já esteve em Santos? Sabe o que se passa na maioria das capitais do Norte-Nordeste? Já examinou a situação das nossas cidades médias onde a principal emissora de TV é também a principal acionista do maior diário? Conhece os regulamentos da Federal Communications Commission (FCC) americana que impedem a propriedade cruzada de veículos na mesma região?

A síndrome do medo tem várias causas e várias terapias. Fármacos resolvem. O divã, porém, é mais eficaz.

segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

Exposição “Retrato de Mulheres” chega ao Maitê

por Silmara Helena
A exposição Retrato de Mulheres do Jardim Maitê estará, a partir desta terça-feira (19/1), na sede da Associação de Moradores do bairro. O trabalho, realizado pelo fotógrafo Wanderley Costa, da Secretaria Municipal de Comunicação Social (Secom), reúne cerca de 40 imagens em preto e branco de mulheres integradas a projetos sociais desenvolvidos no local.

As fotografias foram feitas em agosto do ano passado como resultado do debate iniciado na entidade sobre “Mulher e Mídia” e que também foi tema de discussão durante a 1ª Conferência Municipal de Comunicação Social - Confecom. O objetivo da exposição é provocar uma reflexão sobre a maneira como a figura feminina é retratada pela mídia e estabelecer um olhar crítico sobre os estereótipos, principalmente estéticos, impostos à mulher através dos meios de comunicação.

A exposição Retrato de Mulheres foi apresentada ao público, pela primeira vez, na abertura da Confecom, mas já foi montada em outros eventos públicos realizados no Centro de Educação e Cultura “Francisco Carlos Moriconi” e no Teatro Municipal “Dr. Armando de Ré”.

Retratos de Mulheres poderá ser visitada pelo público até 26 de fevereiro, de segunda a sexta-feira, das 8h às 17h (com intervalo para almoço das 12h às 13h), na Associação de Moradores do Jardim Maitê (Estrada do Areião, 1.598). Após este período, as fotos poderão ser conferidas na abertura da 6ª Semana da Mulher da Prefeitura de Suzano, que será realizada em março.

terça-feira, 12 de janeiro de 2010

O debate da desinformação

Por Luciano Martins Costa
Comentário para o programa radiofônico do OI, 12/1/2010

Definitivamente, não é pela imprensa que o cidadão brasileiro será informado sobre o verdadeiro significado do Programa Nacional de Direitos Humanos, ponto central da polêmica que inaugura este ano eleitoral.

Até esta data, passadas mais de duas semanas da divulgação do texto do decreto, cujos detalhes já vem sendo discutidos publicamente há anos, os jornais e revistas ainda não fizeram mais do que reproduzir declarações – na maior parte de personalidades contrárias às principais propostas.

A coisa funciona mais ou menos assim: os editores dão uma olhada no essencial e determinam como o tema será abordado. Em seguida saem as pautas para os repórteres, que tratam de coletar declarações.

Para reforçar o controle da opinião que será formada, encomendam-se artigos para os mesmos protagonistas de sempre – aqueles que garantem seu quinhão de exposição pública, pelo talento de agradar a corrente dominante na imprensa, não importa qual seja o assunto.

Essas declarações, pela proporção, pela extensão e pelo destaque que ganham em cada página, definem como pensam os donos dos jornais. E os donos dos jornais são conservadores.

Opiniões radicalizadas
É assim que funciona o mecanismo de controle das discussões públicas. Não que funcione como controle efetivo, porque, com as novas tecnologias de informação, a comunicação se estende para muito além da imprensa de papel e da televisão. Mas, para o mundo institucional, a imprensa tradicional ainda é o principal veículo que organiza e delimita a agenda pública.

Da mesma forma que coloca em discussão sob restrições o Programa Nacional de Direitos Humanos, a imprensa parece pouco interessada em aprofundar o debate de temas importantes que compõem o decreto.

Como o noticiário disponível não contempla as sutilezas do que se propõe no decreto, o resultado é a radicalização das opiniões, como se pode observar nos comentários que suscitam qualquer citação aos temas da proposta.

A discussão pública, inclusive neste Observatório, acontece mais em função da desinformação provocada pela imprensa do que pela informação que a imprensa pode ou quer oferecer.

Saber jurídico

Observe-se, por exemplo, as escaramuças entre "lulistas" e "fernandistas", núcleos principais dos dois blocos políticos em que o Brasil parece inevitavelmente dividido. Os dois lados parecem ignorar que o Programa Nacional de Direitos Humanos é um dos muitos pontos em comum entre a agenda petista e a dos tucanos.

Na verdade, a maior parte dos temas que estão englobados na proposta foi organizada no governo do PSDB, como parte da ambição do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso por dar ao Brasil uma face mais moderna, à maneira européia.

Somente na terça-feira (12/1), quando as posições já se radicalizaram pela desinformação, os jornais observam as semelhanças entre a proposta do governo do PSDB e a do governo atual.

No que se refere à questão do julgamento dos militares que praticaram torturas e assassinatos durante a ditadura e no período da redemocratização, por exemplo, quase escapa do conhecimento dos leitores o fato de que é a Ordem dos Advogados do Brasil, e não uma associação de terroristas, que defende a punição dos criminosos em qualquer época, independentemente de ter havido uma lei de anistia.

Honrando o saber jurídico vigente no mundo civilizado, a OAB quer que a tortura seja considerada crime sem prescrição. Assim também acontece com a maior parte dos outros temas contemplados no decreto.

A vanguarda do atraso
Há evidências de que o texto original sofreu alterações, e essas distorções estão sendo corrigidas. De qualquer maneira, a proposta inteira tem que ser transformada em projetos que serão levados ao Congresso Nacional para serem votados ao longo dos próximos meses. Com a má vontade que caracteriza a maioria dos congressistas quando não há vantagens em jogo. Para eles.

O projeto da descriminalização do aborto, como lembra a Folha de S.Paulo, está travado no Congresso desde 1991. Ao limitar o entendimento da sociedade sobre o que está sendo proposto, a imprensa tradicional reveste de um caráter revolucionário e controverso uma proposta que não faz mais do que equiparar a legislação brasileira ao resto do mundo contemporâneo.

Se o Brasil quer e pode ser uma potência econômica, também tem que dar o passo no sentido de modernizar as regras de convivência social, no que se refere ao direito das mulheres de dispor sobre seu próprio corpo, ao direito à defesa de suspeitos sem coação e tortura, ao direito de agricultores sem terra de pleitear políticas de gestão territorial mais eficientes, e assim por diante.

O resto é desinformação, que só ajuda os vanguardistas do atraso.

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

No reino da hipocrisia

por Silmara Helena
A imprensa brasileira é hipócrita. Ontem (domingo 10/01) ouvia a Rádio Jovem Pan quando entrou na programação um editorial no qual a emissora se posicionava contra o decreto assinado pelo Presidente Lula que, entre outras medidas, abre a possibilidade de punição, até mesmo com a perda da concessão, dos veículos de comunicação que não respeitarem os direitos humanos. Foi o que bastou para que a Jovem Pan já se arvorasse a criticar o governo federal e tratasse a questão como perseguição à imprensa e ameaça à liberdade de expressão.

Ora. Vamos aos fatos:

  • A comunicação no Brasil é dominada por poucas (dez no máximo) famílias que detém a propriedade dos principais veículos do País. Desde Assis Chateubriand, o País não conhece um meio de comunicação que não tenha como forma principal de financiamento a venda de publicidade. Isso faz com que a informação, longe de ser um bem público, torne-se moeda de troca para os mais espúrios interesses;
  • Só tem direito à liberdade de expressão quem tem acesso aos veículos. E para ter acesso aos veículos, o cidadão precisa fazer parte da tal “elite” que domina a comunicação ou abrir espaço na base do dinheiro mesmo. Quem paga ganha espaço. Para falar qualquer coisa, inclusive, mentiras;
  • A imprensa reproduz em suas páginas estereótipos e reforça preconceitos de raça, gênero, opção sexual. Ignora os conflitos entre brancos e negros; discrimina o MST e os movimentos sociais e menospreza a mulher e a luta pela igualdade de gêneros;
  • O Brasil é um dos únicos países do mundo que não tem Lei de Imprensa. Jornalistas irresponsáveis falam e escrevem o que querem. Ao cidadão resta calar-se ou entrar na Justiça em busca de reparação. Os erros, propositais ou não cometidos pela imprensa, já acabaram com vidas e a Folha publicou, sem pudor, um documento falso contra a Ministra da Casa Civil, Dilma Roussef. O que aconteceu com a Folha? Nada. Bom, mas o que esperar de um jornal que emprestava os seus carros para levar presos políticos à tortura?
  • A imprensa não dá direito ao contraditório. Tem lado e favorece este lado ao seu bel prazer, como se o leitor, o ouvinte ou o telespectador fosse um completo idiota e não percebesse a manipulação das informações. O digníssimo apresentador do Jornal Nacional Willian Bonner comparou o telespectador brasileiro ao Simpson pai; diga-se, de passagem, um verdadeiro imbecil (ele e o personagem);
  • Por fim, parte desta imprensa apoiou o golpe militar, como já citei acima em relação à Folha. Alguns jornalistas, como demonstrou bem Boris Casoy , fazem parte desta elite preconceituosa e medíocre, que tem acesso aos meios de comunicação, faz discurso politicamente correto, mas por detrás dos microfones deixa cair as suas máscaras.
É esta imprensa que faz o discurso da liberdade de expressão. Temos de ter sim liberdade de expressão mas para todos. Direito à informação é direito humano. Espero, como jornalista, que o Presidente Lula não ceda às pressões. Mantenha o decreto que pode ser um divisor de águas entre a imprensa séria e esta que, infelizmente, prevalece hoje no País - hipócrita, ditadora e medíocre.

Os delegados da 1ª Conferência Nacional de Comunicação (Confecom) aprovaram diversas propostas voltadas à garantia da democratização dos meios; de participação da sociedade na definição de conteúdo e da punição àqueles veículos que ignoram solenemente o compromisso com a sociedade, e usam as concessões para acumular poder e dinheiro.

O cerco está se fechando. E o Brasil, assim como outros países da América Latina, precisam e vão avançar na consolidação da democracia. No entanto, somente será possível consolidar a democracia, se o Estado garantir, por meio do cumprimento dos preceitos constitucionais, que a imprensa exerça na prática o respeito irrestrito ao direito das pessoas. Com ou sem áudio. Na frente ou por detrás das câmeras.

domingo, 10 de janeiro de 2010

Que vazem os áudios!

Boletim_Carta Maior

Existem consequências e consequências. No caso Ricupero custou-lhe o então muito vistoso Ministério da Fazenda. No caso Bial restou-lhe a opção de apresentar o Big Brother Brasil. No caso Casoy… bem, aí o mistério é impenetrável.

Washington Araújo

E ainda vão criar um sistema fantástico capaz de acessar diretamente o pensamento das chamadas figuras públicas. Seria uma espécie de áudio a ser acionado fora de hora. Não quando o personagem está em ação, dizendo aos telespectadores qual a moral da notícia, qual a real intenção desta e daquela frase deste ou daquele político. Mas sim quando a pessoa, essa que chora e gargalha, sente calor e frio, fome e medo, amor e ódio, troca confidências com seus pensamentos sem a ofuscante luz do refletor nem o cenário espacial do telejornal da noite. Com tantas maravilhas tecnológicas ao nosso alcance há que se inventar o leitor de pensamento, o desmascarador de embuste, o algoz do discurso hipócrita, o aparelho que nos dispa do supérfluo e nos apresente ao ser humano que luta por sobreviver em meio a realidade artificialmente gerada. E já poderíamos fazer alguns testes, logo de antemão.

Numa emissora de tevê o âncora do telejornal declamaria algo mais ou menos assim: “Só temos que nos orgulhar de termos um gari tão honesto e brioso de sua cidadania… pois não é comum vermos essa pessoa simples vir entregar na Delegacia de Polícia a bolsa recheada com R$ 20.000,00 que acabara de encontrar em meio ao lixo do condomínio de luxo…” Acionaríamos a engenhoca logo no primeiro intervalo dos comerciais e escutaríamos algo assim: “Pobre diabo, criatura patética, imbecilizada ao extremo… uma vergonha ir devolver dinheiro encontrado no lixo tantas vezes por ele vasculhado. Um idiota completo.”

Enquanto em outra emissora de tevê o apresentador do telejornal declamaria algo mais ou menos assim: “O Brasil conheceu ontem a história de dona Salustiana, 47 anos, mãe de 14 filhos, destacada catadora de papel de Taboão da Serra. Pois bem, ela concluiu o curso de alfabetização ontem à noite e está feliz da vida por saber agora ler e escrever. Um exemplo de determinação e coragem.” Novo intervalo comercial, trabalho para a engenhoca que, uma vez acionada nos traria o seguinte áudio: “Infeliz que veio ao mundo apenas para dar cria: 14 filhos! E ainda vem com sorriso banguela dizer-se feliz por saber ler e escrever. Sabe nada! No máximo consegue desenhar o nome e olhe lá! É gente assim que atravanca o Brasil!”

E já não se fazem moralistas como antigamente. Em passado recente moralistas de plantão utilizavam a televisão e o rádio para sapecar aulas de EMC (Educação Moral e Cívica). Falavam convictamente sobre a importância de o galo cantar anunciando a alvorada mesmo que o país estivesse no breu da mais torpe ditadura, opressão e tirania. Foi o tempo do faz escuro mas eu canto, o tempo do quando chegar o momento esse meu sofrimento vou cobrar com juros, juro! Naquele tempo sabíamos os que estavam deste lado da luta e os do outro lado. Os papéis eram demarcados. Atualmente predomina a psicologia de pesquisas de opinião pública: se o povo gosta de bordões então o saciarei logo com dois: “Precisamos passar o Brasil a limpo!” e para otimizar o tempo televisivo faça uso de algo mais curto e contundente como “Isto é… uma vergonha!”

Em 02/09/1994 o ministro da Fazenda Rubens Ricupero, em entrevista a Carlos Monforte no programa matinal Bom Dia Brasil teve parte de sua alma revelada em áudio vazado. Ele dizia em intervalo comercial que “o governo faturava o que era bom e escondia o que era ruim”. Ou seja, as autoridades governamentais são sempre inteligentes e a população sempre idiota. Custou-lhe o cargo, a credibilidade e o futuro político. Virou verbete em debates sobre novas tecnologias atendendo pela expressão “A parabólica de Ricupero”.

Mas existem as armadilhas do tempo. O espírito da época, o zeitgeist. Somos herdeiros direitos da chamada Era dos Direitos para usar aquela feliz expressão de Bobbio. O principal direito é o direito à humanidade. O principal instrumento para orientar a vida ordenada do planeta responde pelo pomposo título de Declaração Universal dos Direitos Humanos e tem data de fabricação (10/12/1948) mas não tem (ainda bem!) prazo de validade. Acontece que para fazer valer os direitos humanos precisamos abraçar de coração, com áudio ligado ou desligado, som perene ou vazando, não importa, ideias como respeito à diversidade de gênero, de raça, de cor, de credo, de classe, de nacionalidade. Passaram-se 11 anos mas muito gente ainda lembra daquela noite em que Pedro Bial provavelmente sem saber que o microfone estava aberto fala durante apresentação do balé Kirov: “Isso é coisa de viado” (Fantástico, 17/05/1998).

Deixei para o fim do texto a citação das palavras de Boris Casoy, âncora do telejornal da Band e que foi ao ar na noite do primeiro dia de 2010. O jornalista fez comentários infelizes após um vídeo com a participação de dois garis desejando votos de Feliz Ano Novo. Durante as imagens, vazou um áudio de Boris falando: "que m... dois lixeiros desejando felicidades do alto de suas vassouras" e "dois lixeiros, o mais baixo da escala do trabalho". Um primor de preconceito e desprezo contra cidadãos sem canudo, sem herança, sem traquejo para investir em bolsa de valores e sem sobrenome chamativo como Diniz, Sendas, Steinbruch, Skaff, Marinho, Saad, Civita, Agneli ou Casoy.

No segundo dia do ano, após ver desabar sua reputação de grande humanista, fiscal da moral alheia e algoz dos politicamente incorretos, principalmente se estiverem na política, Casoy pediu desculpas: "Ontem (quinta) durante o programa eu disse uma frase infeliz que ofendeu os garis. Peço profundas desculpas aos garis e a todos os telespectadores." Ficamos com a pulga atrás da orelha: o que teria ele dito em particular no intervalo de suas desculpas, enquanto o áudio estava fechado? Algo ficou evidenciado no pedido de desculpas: ele se refere à “frase infeliz” que “ofendeu os garis e a todos os telespectadores”. Primeiro que não se tratou de uma frase infeliz, é relativizar demais, ser muito reducionista e complacente com seus erros. Ele usou conceitos elaborados dando conta da evolução na escala do trabalho e determinando desde seu lugar de fala (atenção estudiosos da linha francesa de análise de discurso) que os garis estão ali, na altura do rés do chão. Resta-nos perguntar: em que posição Casoy se encontrava antes do vazamento do aúdio? E após o vazamento, qual a sua posição na escala dos valores humanos?

Existem consequências e consequências. No caso Ricupero custou-lhe o então muito vistoso Ministério da Fazenda. No caso Bial restou-lhe a opção de apresentar o Big Brother Brasil. No caso Casoy… bem, aí o mistério é impenetrável. Isso me lembra aquele cartoon do Charlie Brown. Nosso personagem caminha solitário em direção oposta a uma multidão de manifestantes, cada qual portando cartaz com abaixo isto e abaixo aquilo… então a Lucy pergunta ao Charlie Brown se ele não iria carregar uma faixa com abaixo a civilização! Brown responde, filosófico: “Não precisa… ela cairá… de tão podre.”

Em tempo:
O vídeo do Rícupero foi visto 33.009 no Youtube.
O vídeo do Bial foi visto 101.468 no Youtube.
O vídeo do Casoy foi visto 362.485 no Youtube.

Washington Araújo é jornalista e escritor. Mestre em Comunicação pela
UNB, tem livros sobre mídia, direitos humanos e ética publicados no Brasil,
Argentina, Espanha, México. Tem o blog http://www.cidadaodomundo.org
Email - wlaraujo9@gmail.com

Os EUA e "pacificação presidencial" na América Latina

O presidente Barack Obama distanciou os EUA de quase toda América Latina e Europa ao aceitar o golpe militar que derrubou a democracia hondurenha em junho passado. O apoio ao processo eleitoral garantiu para os EUA o uso da base aérea de Palmerola, em território hondurenho, cujo valor para o exército estadunidense aumenta na medida em que está sendo expulso da maior parte da América Latina. Obama abriu a brecha ao apoiar um golpe militar, repetindo uma prática dos EUAbem conhecida na América Latina. O artigo é de Noam Chomsky.

Noam Chomsky

Barack Obama é o quarto presidente estadunidense a ganhar o Prêmio Nobel da Paz, unindo-se a outros dentro de uma longa tradição de pacificação que desde sempre serviu aos interesses dos EUA. Os quatro presidentes deixaram sua marca em nossa “pequena região” ("nosso quintal"), que "nunca incomodou ninguém", como caracterizou o secretário de Guerra, Henry L. Stimson, em 1945. Dada a postura do governo de Obama diante das eleições em Honduras, em novembro último, vale a pena examinar esse histórico.

Theodore Roosevelt
Em seu segundo mandato como presidente, Theodore Roosevelt disse que a expansão de povos de sangue branco ou europeu durante os quatro últimos séculos viu-se ameaçada por benefícios permanentes aos povos que já existiam nas terras onde ocorreu essa expansão (apesar do que possam pensar os africanos nativos, americanos, filipinos e outros supostos beneficiados).

Portanto, era inevitável e, em grande medida, desejável para a humanidade em geral que o povo estadunidense terminasse por ser maioria sobre os mexicanos ao conquistar a metade do México, além do que estava fora de qualquer debate esperar que os (texanos) se submetessem à supremacia de uma raça inferior. Utilizar a diplomacia dos navios de artilharia para roubar o Panamá da Colômbia e construir um canal também foi um presente para a humanidade.

Woodrow Wilson
Woodrow Wilson é o mais honrado dos presidentes premiados com o Nobel e, possivelmente, o pior para a América Latina. Sua invasão do Haiti, em 1915, matou milhares de pessoas, praticamente reinstaurou a escravidão e deixou grande parte do país em ruínas.

Para demonstrar seu amor à democracia, Wilson ordenou a seus mariners que desintegrassem o Parlamento haitiano a ponta de pistola em represália pela não aprovação de uma legislação progressista que permitiria às corporações estadunidenses comprar o país caribenho. O problema foi resolvido quando os haitianos adotaram uma Constituição ditada pelos Estados Unidos e redigida sob as armas dos mariners. Tratava-se de um esforço que resultaria benéfico para o Haiti, assegurou o Departamento de Estado a seus cativos.

Wilson também invadiu a República Dominicana para garantir seu bem-estar. Esta nação e o Haiti ficaram sob o mando de violentos guardas civis. Décadas de tortura, violência e miséria em ambos países foram o legado do idealismo wilsoniano, que se converteu em um princípio da política externa dos EUA.

Jimmy Carter
Para o presidente Jimmy Carter, os direitos humanos eram a alma de nossa política externa. Robert Pastor, assessor de segurança nacional para temas da América Latina, explicou que havia importantes distinções entre direitos e política: lamentavelmente a administração teve que respaldar o regime do ditador nicaragüense Anastásio Somoza, e quando isso se tornou impossível, manteve-se no país uma Guarda Nacional treinada nos EUA, mesmo depois de terem ocorrido massacres contra a população com uma brutalidade que as nações reservam para seus inimigos, segundo assinalou o mesmo funcionário, e onde morreram cerca de 40 mil pessoas.

Para Pastor, a razão era elementar: os EUA não queriam controlar a Nicarágua nem nenhum outro país da região, mas tampouco queria que os acontecimentos saíssem do seu controle. Queria que os nicaragüenses atuassem de forma independente, exceto quando essa independência afetasse os interesses dos Estados Unidos.

Barack Obama
O presidente Barack Obama distanciou os EUA de quase toda América Latina e Europa ao aceitar o golpe militar que derrubou a democracia hondurenha em junho passado. A quartelada refletiu abismais e crescentes divisões políticas e socioeconômicas, segundo o New York Times. Para a reduzida classe social alta, o presidente hondurenho Manuel Zelaya converteu-se em uma ameaça para o que esta classe chama de democracia, que, na verdade, é o governo das forças empresariais e políticas mais fortes do país.

Selaya adotou medidas tão perigosas como o incremento do salário mínimo em um país onde 60% da população vive na pobreza. Tinha que ir embora. Praticamente sozinho, os EUA reconheceram as eleições de novembro (nas quais saiu vitorioso Pepe Lobo), realizadas sob um governo militar e que foram uma “grande celebração da democracia”, segundo o embaixador de Obama em Honduras, Hugo Llorens. O apoio ao processo eleitoral garantiu para os EUA o uso da base aérea de Palmerola, em território hondurenho, cujo valor para o exército estadunidense aumenta na medida em que está sendo expulso da maior parte da América Latina.

Depois das eleições, Lewis Anselem, representante de Obama na Organização de Estados Americanos (OEA), aconselhou aos atrasados latinoamericanos que aceitassem o golpe militar e seguissem os EUA no mundo real e não no mundo do realismo mágico.

Obama abriu a brecha ao apoiar um golpe militar. O governo estadunidense financia o Instituto Internacional Republicano (IRI, na sigla em inglês) e o Instituto Nacional Democrático (NDI) que, supostamente, promovem a democracia. O IRI apóia regularmente golpes militares para derrubar governos eleitos, como ocorreu na Veenzuela, em 2002, e no Haiti, em 2004. O NDI tem se contido. Em Honduras, pela primeira vez, esse instituto concordou em observar as eleições realizadas sob um governo militar de facto, ao contrário da OEA e da ONU, que seguiram guiando-se pelo mundo do realismo mágico.

Devido à estreita relação entre o Pentágono e o exército de Honduras e à enorme influência econômica estadunidense no país centroamericano, teria sido muito simples para Obama unir-se aos esforços latinoamericanos e europeus para defender a democracia em Honduras. Mas Barack Obama optou pela política tradicional.

Em sua história das relações hemisféricas, o acadêmico britânico Gordon Connell-Smith escreve: "Enquanto fala, da boca para fora, em defesa de uma democracia representativa para a América Latina, os Estados Unidos têm importantes interesses que vão justamente na direção contrária e que exigem um modelo de democracia meramente formal, especialmente com eleições que, com muita freqüência, resultam numa farsa".

Uma democracia funcional pode responder às preocupações do povo, enquanto os EUA estão mais preocupados em construir as condições mais favoráveis para seus investimentos privados no exterior? Requer-se uma grande dose do que às vezes se chama de ignorância intencional para não ver esses fatos. Uma cegueira assim deve ser zelosamente guardada se é que se deseja que a violência de Estado siga seu curso e cumpra sua função. Sempre em favor da humanidade, é claro, como nos lembrou Obama mais uma vez ao receber o Prêmio Nobel.

Tradução: Katarina Peixoto

quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

Boris Casoy, o filho do Brasil

Um olhar sobre a "elite branca" brasileira

por Paulo Ghiraldelli

Uma parte da nossa esquerda política imagina que os ricos não são brasileiros. Pensam que eles ainda são os filhos de uma elite que estudou na Europa e que, se o Brasil for mal, irá embora daqui. Imagina que são pessoas completamente por fora da vida cotidiana do Brasil. Essa visão da esquerda pouco ajuda. Enquanto não entendermos que um homem de direita como Boris Casoy é tão “filho do Brasil” quanto Lula, não vamos descrever o Brasil de um modo útil para os nossos propósitos de melhorá-lo.

Creio que o vídeo (aqui) que mostra Boris ridicularizando de maneira odiosa os garis, com o qual iniciamos o ano, deveria valer de uma vez por todas para compreendermos algo que, não raro, há vozes que querem negar: “o ódio de classe” permanece entre nós – sim, nós os brasileiros. Deveríamos levar em conta isso, sem medo, ao descrever o Brasil.

Quando Ciro Gomes, ao comentar algumas reações às políticas sociais, então vindas de determinados grupos da imprensa, disse que tal coisa era obra “da elite branca”, a reação da direita foi imediata. Um dos elementos mais à direita que temos na imprensa brasileira, Reinaldo de Azevedo, saiu rasgando o verbo. Primeiro, elogiou Patrícia Pillar, atriz mulher de Ciro, para não criar desafetos, e em seguida tratou o político como um bobalhão que teria falado de algo que não existe no Brasil. Ciro teria bebido demais em algum rortianismo, lá nos Estados Unidos, quando então fez curso arrumado por Mangabeira Unger. Voltando de lá mais à esquerda do que foi, estaria inventando divisões que aqui não existiriam. Reinaldo não é um jornalista sofisticado para escrever isso, mas o que disse, no meio de sua pouca cultura, queria transmitir essa idéia.

Mas quando ouvimos o que um Boris Casoy diz por detrás das câmeras, não temos como não admitir que Ciro está certo: existe uma “elite branca” no Brasil que sente profundo desprezo para com tudo que é do âmbito popular. Pode ser que vários membros dessa “elite branca” não sejam tão cruéis quanto Casoy. Pode ser, mesmo, que vários dos ricos que estão nessa “elite branca” se sintam desconfortáveis, perante os preceitos cristãos de humildade que dizem adotar, quando escutam isso que ouvimos de Boris Casoy. Todavia, o que Casoy falou é o que se pode ouvir, entre um uísque e outro, nas festas antes organizadas pelo empresariado que amava da Ditadura Militar, e que hoje é feita para angariar fundos para o PSDB, o partido que havia nascido com o propósito de não ser a direita política, mas que, agora, assume esse papel.

Não quero de modo algum, com esse artigo, provocar aqueles que, sempre pensando só de modo dual, logo dirão: “ah, mas a esquerda é blá, blá, blá”. Sou um homem de esquerda. Minha condição de filósofo me dá alguns instrumentos para analisar de onde venho. Podem ficar tranqüilos. Aliás, sou uma pessoa que adora a frase de Fernando Henrique Cardoso, quando ele disse, se referindo a ele mesmo por conta de acreditar que sua política econômica, ela própria, já era política social: “não é necessário ser burro para ser de esquerda”. Mas aqui, não quero falar da esquerda. Quero mostrar que gente como Boris Casoy não caiu no Brasil vindo de Plutão. Muito menos estudou na Europa. Gente como Boris Casoy estava no Mackenzie, fazendo curso superior, mais ou menos no tempo em que Lula deveria estar vendendo limão na rua. Isso não transforma o Lula em um bom homem e o Boris em um perverso. Mas isso dá, claramente, razão a Ciro Gomes: há sim uma “elite branca” que não respeita garis, que não os acham gente, e que transferem esse ódio ao Lula, principalmente quando olham para ele e o vêem sendo abraçado por um Sarkozi, na capa do Le Monde.

Sarkozi é o presidente da França. E não é de esquerda. Eis então que toda a direita no Brasil comemorou sua eleição. Todavia, Sarkozi aparece abraçado com Lula, sem o preconceito de classe que vários dos próprios brasileiros ainda possuem contra Lula, então, esse fato Lula-Sarkozi, deixa essa “elite branca” despeitada. Ela se pergunta, raivosa: “por que não FHC ou Serra?” Por que aquele “analfabeto”, por que ele, aquele … “gari”? Sim, a fala de Boris é o equivalente dessas frases que eram, até pouco tempo, restritas aos círculos da Ana Maria Braga, Regina Duarte, José Neumanne Pinto e Danusa Leão. Foram esses círculos que fingiram se espantar com o relato de César Benjamim, sobre Lula na prisão. (a história de que Lula teria tentado comer um garoto lá). Fingiram, sim, pois já haviam escutado isso em festinhas e riam disso, tratavam de fazer correr a fofoca, sendo ela verdadeira ou não.

Caso queiramos melhorar o Brasil, vamos ter de ver que os brasileiros – muitos – pensam como Boris Casoy. E atenção nisso: não vamos culpá-lo pelos seus cabelos brancos não! Mainardi, na Globo, ainda não tem cabelos brancos e pensa a mesma coisa. Na Band, vocês já viram o tipo de preconceito de classe contra pobres que aparece no CQC? Já viram o menino Danilo Gentili insultando os pobres, jogando comida para eles? Não? Pois saibam que isso ocorreu sim! Esse tipo de humor é necessário?

Estamos há duas décadas da “piada” de Chico Anísio contra Lula, dizendo que se Marisa fosse a primeira dama e fosse morar no Planalto, ficaria esgotada ao ver quantas janelas de vidro teria de limpar. Naquela época, a Globo fez Chico Anísio pedir desculpas em artigo na imprensa. E ele pediu! De lá para cá, o que mudou na TV brasileira? Ora, o vídeo de Boris Casoy nos diz que pouca coisa mudou. Que ainda precisamos de muito para evoluirmos. Temos uma longa caminhada pela frente no sentido de educar aquele brasileiro que não consegue entender que o dia que um lixeiro parar, ele, o rico, vai ver todas as moscas botarem ovos no seu ânus, e quando ele acordar, ele terá sido devorado em vida pelos vermes. Estamos ainda precisando de uma forte pedagogia que entre nas escolas de modo a evitar que os brasileiros do futuro sejam os Casoys da vida.

As pessoas podem ser de direita, isso não deveria implicar em perder a capacidade de ver na condição social de concidadãos algo que não os desmerece (o bom exemplo não é, enfim, o próprio Sarkozi?). No Brasil, no entanto, a direita política não consegue apresentar um comportamento de brasileiros que gostaríamos que todos nós fôssemos, ou seja, pessoas capazes de ver em cada outro que lhe presta um serviço um homem digno.

Paulo Ghiraldelli Jr, filósofo.
http://ghiraldelli.pro.br/2010/01/boriscasoy/

quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

Luiza Erundina agradece solidariedade. Suzano também colaborou

Agradecimento por uma ação coletiva de solidariedade política


por Luiza Erundina

Fim de ano é tempo propício à reflexão sobre o que passou, sobre o caminho percorrido e as perspectivas para o futuro.

Entre os acontecimentos que marcaram o ano de 2009, destacaria um fato inusitado, de profundo significado político, que nos surpreendeu a todas e todos, sugerindo que algo novo e transformador começa a despontar na sociedade brasileira, relacionado à política. Refiro-me ao extraordinário e espontâneo movimento de solidariedade política que envolveu milhares de pessoas pelo país afora que, movidas por forte sentimento de justiça, se mobilizaram para reparar uma injustiça de que eu fui vítima. É incompreensível que exatamente quem sempre se comportou, como era do meu dever, de forma ética e absolutamente fiel aos meus compromissos com a população, esteja sendo punida com tanto rigor.

Suponho que, além do sentimento de justiça, um outro teria motivado tão amplo e plural movimento de solidariedade, que seria o de indignação diante de um fato insólito na história política brasileira, ou seja, minha condenação, pelo Poder Judiciário, a pagar uma dívida à Prefeitura de São Paulo de mais de R$350 mil reais, correspondentes ao valor reajustado, ao longo de vinte anos, da publicação, em alguns jornais, de uma nota informando à população sobre a posição do governo a respeito da greve geral dos trabalhadores, ocorrida em março de 1989.

Foi uma decisão de um governo eleito pelas e pelos trabalhadores e que tinha compromissos claros com eles e com os setores populares da sociedade.

Além disso, na época vivia-se uma conjuntura caracterizada por desemprego, arrocho salarial e inflação superior a 80%, exigindo, portanto, posicionamento claro a respeito de que lado se estava. Se do lado do governo federal, cuja política econômica impunha enormes sacrifícios aos trabalhadores, ou do lado destes, apoiando suas justas e legítimas reivindicações. E o nosso Governo optou por esta posição, pois tinha lado. Não era neutro, até porque a neutralidade não existe, pois ela sempre serve ao interesse de um dos lados em disputa.

Tenho refletido e procurado julgar a mim mesma sobre aquela decisão e cheguei à conclusão de que era exatamente a que deveríamos tomar. E mais do que isso estou convencida de que, em situação semelhante, assumiríamos a mesma posição, fossem quais fossem os riscos que tivéssemos que correr.

Aquela condenação provocou, como se viu, perplexidade e indignação em muita gente, resultando em um movimento de solidariedade política que envolveu milhares de pessoas, grupos, organizações populares, empresários, lideranças sindicais, parlamentares, dirigentes e militantes dos mais diversos partidos políticos; lideranças religiosas e de movimentos sociais e tantos outros que de forma anônima materializaram seu apoio depositando na “Conta:Luiza, apóio você” importâncias de dois, cinco, vinte, cinqüenta ou até valores de milhares de reais, o que possibilitou o “milagre” que só a solidariedade generosa e desinteressada é capaz de operar. O fato é que hoje, 4 de janeiro de 2010, já dispomos do montante suficiente para saldar essa dívida que a justiça me impôs.

Como explicar tão surpreendente reação? Senso de justiça? Afirmação e valorização da ética na política? Que lição tirar de tudo isso?

Gestos de tamanha generosidade e solidariedade, não só me comovem, profundamente, como também me dão a certeza de que a política é mais do que a organização de pessoas em torno de um projeto de poder que disputa com outros projetos de poder, mas, a política é também ação coletiva de sujeitos livres que, juntos, constroem a cidade de todas e todos, como espaço de convivência fraterna e democrática.

Finalmente, desejo expressar minha profunda gratidão a todas e todos que, de forma anônima e generosa, e muitos até com sacrifício, me ajudaram a sair da situação constrangedora em que me encontrava.

Com os meus cumprimentos de fim de ano, formulo votos para que 2010 seja pleno de paz e de grandes realizações.

Com abraços afetuosos.
Luiza Erundina

Relatório da 1ª Confecom está disponível em site

Atenção navegantes!

O relatório das propostas aprovadas na plenária final da 1ª Conferência Nacional de Comunicação - Confecom está disponível no site http://www.confecom.com.br/ (aliás temos o link direto aqui do blog).
O documento, que contém as propostas aprovadas por consenso e com  mais de 80% dos votos dos delegados, possui 218 páginas e está disponível em PDF.
A Comissão Organizadora também preparou uma lista com o conjunto de propostas não apreciadas na plenária final. É que no último dia da Confecom, muitas delegações tiveram de sair antes do término da Conferência devido ao horário do vôo marcado pelo Ministério das Comunicações para retorno dos grupos aos seus respectivos Estados. Diante disso, a pedido da sociedade civil, a votação das questões mais polêmicas foi antecipada e, em seguida, o processo de votação foi suspenso, gerando este conjunto de proposituras que não entraram no relatório final.
A 1ª Confecom ocorreu de 14 a 17 de dezembro do ano passado em Brasília e reuniu mais de 1.600 delegados de todo o Brasil.


*Aliás, vale a pena conferir os links disponíveis em nosso blog. Não sei quem atualizou (já agradeço) mas demos um "up" em nossa lista, permitindo a quem acessa o http://www.comunicasuzano.blogspot.com/ ter a possibilidade de clicar em outros blogs sobre comunicação e fóruns importantes de mídia. Vale a pena conferir.

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

Confecom e a democracia

Enio Taniguti e José Roberto Mello

A realização da 1ª Conferência Nacional de Comunicação (Confecom) na história desse país, ocorrida entre os dias 14 e 17 de dezembro, revelou que a democracia brasileira vem se consolidando a passos lentos, porém, precisos e consensuados. Nossa história política, econômica e social é baseada na concentração da riqueza e do poder. Esse tipo de lógica construiu um Estado Nacional excludente, antidemocrático e muito pouco transparente.

As reações das populações e setores excluídos ganharam grande impulso com a redemocratização, ocorrida no final da década de 80 do século passado. Daí decorrem vários movimentos, entre eles se destacam a luta contra o grande latifúndio agrário que pautou a criação do Movimento dos Sem Terra; o direito de realizar greves e pela melhoria das condições de trabalho, notadamente comandados pelos metalúrgicos do ABC; e a organização dos movimentos populares pelo acesso aos serviços básicos como saúde e educação nas principais cidades brasileiras.

Porém, nestes anos todos, um grande latifúndio se consolidou e quase passou imune às novas realidades que hoje compõem o cenário político, econômico e social do país. Trata-se do monopólio das comunicações comandado ainda por pouquíssimas famílias em todo o Brasil. Mas nos últimos dez anos, com o advento e a velocidade das novas tecnologias, a rede de propagação de informações e conteúdos vem mudando consideravelmente e, aos poucos, modificando esse quadro.

O acesso à internet tem propiciado novas formatações de opinião que não se baseiam mais nos antigos meios como jornais de grande circulação e das redes de TV. De outro lado, há um crescimento considerável das mídias regionais e institucionais que já conseguem, em muitos casos, realizar uma cobertura que reflita as forças relevantes locais, porém, sem deixar de atender as demandas por informações globais. Ou seja, aos poucos o país também vem mudando a sua concepção de produzir comunicação, mais focado na diversidade cultural, social e política e menos nos interesses de grandes grupos econômicos.

Nesse sentido, os resultados da Confecom, que servirão para projetos tanto do Legislativo quanto do Executivo, foram relevantes e estão sintonizados com essa nova realidade. A aprovação das propostas foram consensuadas por delegados dos poderes públicos, da sociedade civil e do empresariado.

Para o setor público, foi aprovada, entre outros, a regulamentação para garantir que as prefeituras municipais sejam responsáveis pela gestão de um dos canais digitais decorrentes do decreto presidencial 5.580 de 2006. Outro ponto fundamental, e que pode ter aplicação imediata, é a viabilização de canais analógicos existentes, sobretudo nos centros urbanos onde há grande congestionamento de propagação de ondas, como é o caso da região metropolitana de SP, para propiciar a prestação de serviços de radiodifusão pelo sistema público.

Além disso, a Confecom aprovou a criação de Conselhos de Comunicação nos âmbitos federal, estadual e municipal, de caráter paritário com membros eleitos, para acompanhar a execução de políticas públicas de comunicação no que diz respeito à regulação de conteúdos; concessões e mecanismos de distribuição. Outra proposta diz respeito ao financiamento público para incentivos à Educação Profissional que vise à universalização do conhecimento tecnológico para produção de conteúdo nas diversas mídias, bem como a disponibilização de canais comunitários locais, com prioridade ao uso de software livre. Foi definida ainda a criação de um Plano Nacional de Banda Larga, com finalidade de inclusão social.

Portanto, a Confecom não só deixou clara as diversas situações em que se encontram a produção, a distribuição e o financiamento das comunicações no Brasil, mas também a necessidade de se aproveitar as novas oportunidades que se colocam, como a Banda Larga para toda população, bem como a consolidação dos canais digitais, e o aproveitamento das linhas de financiamento voltadas especificamente para o setor, que podem ser via BNDES, Fundos Públicos e também pelo FUST (Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações), principalmente para viabilizar a infraestrutura necessária para a irradiação dos conteúdos.

A região do ABCD por sua vanguarda e pionerismo na busca de soluções que visam à melhoria de qualidade de vida da população, seja no aspecto prático, como no cultural e político, poderá dar um passo decisivo na implantação de algumas propostas aprovadas pela Confecom. O Consórcio Intermunicipal, que logo se tornará de caráter público, poderá aglutinar as iniciativas para que os municípios se preparem para, por exemplo, a criação do canal digital local, que poderá se estabelecer como uma rede regional . Outra discussão é a implantação dos conselhos municipais de comunicação. O que representaria um grande passo para a democratização ao acesso, produção e distribuição dos conteúdos nos sete municípios.

Enio Taniguti e José Roberto Mello; jornalistas, respectivamente, assessor especial de gabinete da prefeitura de Diadema e secretário de comunicação de Mauá, foram delegados pelo ABC na 1ª Confecom.

Boris Casoy é "uma vergonha"

Cai a máscara do âncora da TV Bandeirantes

por Altamiro Borges - de São Paulo

Os lixeiros apenas desejavam um feliz 2010Primeiro vídeo: ao encerrar o Jornal da Band da noite de 31 de dezembro de 2009, dois garis de São Paulo aparecem desejando feliz ano novo ao povo brasileiro. Na sequência, sem perceber o vazamento de áudio, o fascistóide Boris Casoy, âncora da TV Bandeirantes, faz um comentário asqueroso: “Que merda... Dois lixeiros desejando felicidades... do alto de suas vassouras... Dois lixeiros... O mais baixo da escala do trabalho”.

Segundo vídeo: na noite seguinte, o jornalista preconceituoso pede desculpas meio a contragosto: “Ontem, durante o programa, eu disse uma frase infeliz que ofendeu os garis. Eu peço profundas desculpas aos garis e a todos os telespectadores”. Numa entrevista à Folha, porém, Boris Casoy mostra que não se arrependeu da frase e do seu pensamento elitista, mas sim do vazamento. “Foi um erro. Vazou, era intervalo e supostamente os microfones estavam desligados”.

Do CCC à assessoria dos golpistas
Este fato lastimável, que lembra a antena parabólica do ex-ministro de FHC, Rubens Ricupero – outras centenas de comentários de colunistas elitistas da mídia hegemônica infelizmente nunca vieram ao ar –, revela como a imprensa brasileira “é uma vergonha”, para citar o bordão de Boris Casoy, com seu biquinho e seus cacoetes. O episódio também serve para desmascarar de vez este repugnante apresentador, que gosta de posar de jornalista crítico e independente.

A história de Boris Casoy é das mais sombrias. Ele sempre esteve vinculado a grupos de direita e manteve relações com políticos reacionários. Segundo artigo bombástico da revista Cruzeiro, em 1968, o então estudante do Mackenzie teria sido membro do Comando de Caça aos Comunistas (CCC), o grupo fascista que promoveu inúmeros atos terroristas durante a ditadura militar. Casoy nega a sua militância, mas vários historiadores e personagens do período confirmam a denúncia.

Âncora da oposição de direita
Ainda de 1968, o direitista foi nomeado secretário de imprensa de Herbert Levy, então secretário de Agricultura do governo biônico de Abreu Sodré – em plena ditadura. Também foi assessor do ministro da Agricultura do general Garrastazu Médici na fase mais dura das torturas e mortes do regime militar. Em 1974, Casoy ingressou na Folha de S.Paulo e, numa ascensão meteórica, foi promovido a editor-chefe do jornal de Octávio Frias, outro partidário do setor “linha dura” dos generais golpistas. Como âncora de televisão, a sua carreira teve início no SBT, em 1988.

Na seqüência, Casoy foi apresentador do Jornal da Record durante oito anos, até ser demitido em dezembro de 2005. Ressentido, ele declarou à revista IstoÉ que “o governo pressionou a Record [para me demitir]... Foram várias pressões e a final foi do Zé Dirceu”. Na prática, a emissora não teve como sustentar seu discurso raivoso, que transformou o telejornal em palanque da oposição de direita, bombardeando sem piedade o presidente Lula no chamado “escândalo do mensalão”.

Nos bastidores da TV Bandeirantes
Em 2008, Casoy foi contratado pela TV Bandeirantes e manteve suas posições direitistas. Ele é um inimigo declarado dos movimentos grevistas e detesta o MST. Não esconde sua visão elitista contra as políticas sociais do governo Lula e alinha-se sempre com as posições imperialistas dos EUA nas questões da política externa. O vazamento do vídeo em que ofende os garis confirma seu arraigado preconceito contra os trabalhadores e tumultuou os bastidores da TV Bandeirantes.

Entidades sindicais e populares já analisam a possibilidade de ingressar com representação junto à Procuradoria Geral da República. Como ironiza Beto Almeida, presidente da TV Cidade Livre de Brasília, seria saudável o “Boris prestar serviços comunitários por um tempo, varrendo ruas, para ter a oportunidade de fazer algo de útil aos seus semelhantes”. Também é possível acionar o Ministério Público Federal, que tem a função de defender os direitos constitucionais do cidadão junto “aos concessionários e permissionários de serviço público” – como é o caso das TVs.

Na 1ª Conferência Nacional de Comunicação, realizada em dezembro, Walter Ceneviva, Antonio Teles e Frederico Nogueira, entre outros dirigentes da Rede Bandeirantes, participaram de forma democrática dos debates. Bem diferente da postura autoritária das emissoras afiliadas à Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), teleguiadas pela Rede Globo. Apesar das divergências, essa participação foi saudada pelos outros setores sociais presentes ao evento. Um dos pontos polêmicos foi sobre a chamada “liberdade de expressão”. A pergunta que fica é se a deprimente declaração de Boris Casoy faz parte deste “direito absoluto”, quase divino.


Altamiro Borges é jornalista, membro do Comitê Central do PCdoB - Partido Comunista do Brasil autor do livro Sindicalismo, resistência e alternativas (Editora Anita Garibaldi)

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