quarta-feira, 30 de junho de 2010

A fonte da juventude

MULHERES EM RISCO


A perigosa busca pela magia instantânea

Por Ligia Martins de Almeida em 29/6/2010

Enquanto parte da mídia – especialmente as revistas dedicadas às celebridades – continuar divulgando lipos e implantes como conquistas, as mulheres vão continuar atrás da solução mágica para suas insatisfações pessoais. Esse tipo de mídia, aliada a profissionais inescrupulosos, acaba induzindo suas leitoras a procurar a magia instantânea, como mostrou a Folha de S.Paulo na matéria "Médicos fazem parcerias com famosas para divulgar clínicas":

"Quando Mirella Santos, modelo, ex-participante do programa A Fazenda e atual mulher do cantor Latino, trocou as próteses de silicone dos seios, um fotógrafo acompanhou cada passo. A moça, maquiada e sempre sorridente, foi fotografada ao se preparar para a cirurgia, ao ser medicada e enquanto o cirurgião plástico fazia a incisão em seu corpo. `Achei bacana. Pelo menos eu dou um moral também para o médico´, diz ela.

O médico em questão é Ricardo Cavalcanti Ribeiro, que aparece abraçado com ela em parte das fotos. A operação, segundo Mirella, foi fruto de um acordo com o cirurgião plástico. `A gente fez uma parceria, né? Afinal, eu também estava divulgando o nome dele.´ Parcerias como essa estão cada vez mais comuns. Enquanto o médico entra com o bisturi, a celebridade entra com a propaganda na mídia. A cirurgia de Mirella, segundo o médico, saiu de 30% a 40% mais barata. E as fotos foram bastante publicadas" (Folha de S.Paulo, 27/06/2010).

As mortes após cirurgia plástica, especialmente lipoaspirações, têm sido notícia de dois anos para cá. Sempre envolvendo mulheres. Os jornais de domingo voltaram ao assunto, para discutir, desta vez, a atuação dos médicos.

73% das cirurgias plásticas são estéticas
O Estado de S. Paulo traz uma matéria alertando para os riscos da anestesia, fazendo uma importante denúncia: a de que, por economia, a consulta prévia com o anestesista é eliminada antes de algumas cirurgias plásticas:

"A maioria dos pacientes de uma cirurgia plástica se preocupa sempre com o preço, às vezes com a expertise do médico e quase nunca com a anestesia. Se o que determina o sucesso do procedimento do ponto de vista estético é a habilidade do cirurgião, cabe ao anestesista – ou anestesiologista, como eles preferem ser chamados – a tarefa mais importante: fazer com que o paciente saia, além de mais bonito, vivo da mesa de operação. Uma das formas que o mercado usa para enxugar o custo é eliminar etapas importantes de avaliação médica, como a consulta com o anestesista, profissional que o paciente encontra só na mesa de cirurgia" (O Estado de S.Paulo, 27/06/2010).

O professor Irimar de Paula Posso (da Faculdade de Medicina da USP), entrevistado pelo jornal, diz: "Estou cansado de ouvir casos de pacientes que morrem na mesa de operação. Toda cirurgia tem um risco, mas quando o procedimento é muito barato, alguma coisa foi deixada de lado."

O custo menor das cirurgias – que o jornal não discute – é, certamente, o responsável pelos números apresentados no box da matéria: 73% das cirurgias plásticas feitas no país são estéticas e apenas 27% são reparadoras, segundo a SPCB. Das cirurgias estéticas, 21% são para implante de prótese mamária; 20%, lipoaspirações e 15%, abdome.



Atrás de soluções mágicas
Ao mostrar aos leitores os riscos envolvidos nos vários tipos de anestesia e dar a palavra a médicos para dizer por que preferem um tipo ou outro, o jornal presta um bom serviço. Mas ainda fica devendo: seria preciso discutir o assunto em termos mais simples e diretos e mostrar aos leitores – especialmente às mulheres, a grande maioria das pacientes desses procedimentos – a relação custo-benefício destas cirurgias. Por quanto tempo elas vão continuar com o corpo sonhado – sem barriga, peito perfeito etc. etc? Quanto tempo – e dinheiro – gastariam para obter os mesmos resultados sem cirurgia? Mais interessante ainda seria mostrar a diferença – no bolso e no organismo – entre dieta/exercícios e cirurgia.

As revistas femininas mais sérias, que hoje dão uma grande ênfase às dietas e exercícios, no passado costumavam mostrar "antes de depois" em cirurgia plástica, principalmente no começo das lipoaspirações. Elas estão em dívida com suas leitoras e deveriam tentar pagar a conta mostrando que as cirurgias plásticas só funcionam se a pessoa estiver disposta a uma vida de controle. Mas deveriam, mais do que isso, mostrar que o corpo perfeito não é a solução para todos os problemas.

Enquanto as revistas de celebridade, as revistas femininas, os jornais e a TV continuarem fazendo a apologia das top models e das mulheres com corpo perfeito, as mulheres vão continuar atrás de soluções mágicas, mesmo correndo o risco de

sexta-feira, 18 de junho de 2010

Confecom: propostas somente para 2011

Confecom: implementação de resoluções fica para 2011


Depois de uma ressaca de alguns meses, agora os segmentos partícipes da organização do processo se voltam para a necessária tarefa de tirar as resoluções do papel. No entanto, isso só deve acontecer no próximo governo. O recado foi dado pelo ministro-chefe da Secretaria de Comunicação do Governo Federal, Franklin Martins. Segundo ele, vários pontos "exigem um trabalho de legislação, que não se faz da noite para o dia, mas as propostas que dizem respeito a esses temas serão examinadas pelo governo”.

Redação
Foram mais de 30 mil pessoas envolvidas em todas as Unidades da Federação e 633 propostas aprovadas (veja caderno final http://www.secom.gov.br/sobre-a-secom/publicacoes/confecom). Para além dos números, a 1ª Conferência Nacional de Comunicação ficou marcada pelas intensas disputas pela sua convocação e até mesmo pela sua realização. Sob boicote pesado por parte de setores empresariais capitaneados pela Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e TV (Abert), associação comandada pelas Organizações Globo, o evento reuniu mais de 1600 delegados em Brasília em dezembro de 2009 e elencou uma agenda tão extensa quanto diversa para o setor.

Depois de uma ressaca de alguns meses, agora os segmentos partícipes da organização do processo se voltam para a necessária tarefa de tirar as resoluções do papel. No entanto, isso só deve acontecer no próximo governo. O recado foi dado pelo ministro-chefe da Secretaria de Comunicação do Governo Federal (Secom), Franklin Martins. “Pelo menos esse cinco pontos [temas que o governo usou para dividir as propostas principais-veja a seguir] exigem um trabalho de legislação, que não se faz da noite para o dia, mas as propostas que dizem respeito a esses temas serão examinadas pelo governo”, afirmou.

Martins foi um dos participantes de uma audiência pública que discutiu a implantação das resoluções da Confecom ontem (10), na Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática da Câmara dos Deputados. Segundo ele, após a conclusão do relatório final, o governo está agora se debruçando sobre as resoluções para avaliar as estratégias para transformá-las em ações concretas. Do ponto de vista temático, elas foram divididas em cinco eixos.

Nova legislação
O primeiro reúne aquelas que indicam mudanças no marco regulatório. “A regulação atual é de 1962. Não tinha TV a cores, não tinha rede de TV. Precisamos perder o medo. É preciso um debate aberto e claro sobre as telecomunicações neste cenário de convergência. É evidente que ele está desatualizado, que tem condições de dar conta dos desafios que estão colocados”, comentou.

Esta foi uma das unanimidades da Confecom. Todos os segmentos, dos empresários aos movimentos sociais, criticaram o anacronismo do nosso arcabouço legal e defenderam uma atualização, cada grupo a seu modo. A resistência, velada mas poderosa, ainda vêm dos empresários liderados pelas Organizações Globo, que vêem na mudança uma brecha para o avanço das operadoras de telecomunicação sobre o rádio e a TV.

Para barrar esta necessidade, estes setores evocam a “liberdade de imprensa” contra as ameaças “totalitárias” de controle social da mídia. Carolina Ribeiro, do Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social, defendeu este tipo de prática e lembrou que ela é feita em várias áreas, como na saúde. “A própria Confecom foi um espaço de controle social”, ressaltou. Para ela, o termo na verdade sintetiza mecanismos de ampliação da participação e da fiscalização sobre os meios, necessidade frente ao aumento das violações provocadas pelos veículos.

Dentre as várias recomendações de alteração na legislação, foram separadas como um segundo eixo específico aquelas relativas à regulamentação do Artigo 221 da Constituição Federal. Ele estabelece como prioridade para a programação das emissoras de rádio e televisão as finalidades educativas, artísticas, informativas e culturais e institui como diretrizes a promoção da produção regional e independente.

O representante da Casa Civil, André Barbosa, destacou duas iniciativas já em andamento para modernizar a legislação do setor. Um deles é o Projeto de Lei 29, que trata de novas regras para a TV por Assinatura, permite a entrada de empresas de Telecom neste negócio e institui cotas na programação deste serviço. Outro é o substitutivo da ex-deputada Maria do Carmo Lara (PT-MG) para reformar a Lei das Rádios Comunitárias (9.6112/1998). Sobre ele, José Luís Soter, da Associação Brasileira de Rádios Comunitárias (Abraço), elencou como mudanças centrais o aumento da potência dos transmissores, a anistia para quem foi processado por manter emissoras sem autorização do governo e a criação de um fundo para financiar a comunicação comunitária.

Internet, direito autoral e comunicação pública
O terceiro eixo das propostas é a revisão da legislação para direitos autorais. Esta é uma demanda do próprio governo, puxada pelo Ministério da Cultura. A revisão é defendida para quebrar os privilégios de intermediários, como gravadoras e editoras, e ampliar o acesso aos bens culturais sem deixar de remunerar os artistas.

A demanda de outro ministério foi incluída como o quarto eixo: a aprovação do marco civil da internet. O projeto de lei que define responsabilidades dos agentes na web está sendo debatido de forma aberta no endereço culturadigital.br/marcocivil. Segundo o ex-consultor jurídico do Ministério das Comunicações, Marcelo Bechara, este processo é um exemplo de como já há resoluções sendo implementadas. Outro exemplo seria, segundo ele, o Programa Nacional de Banda Larga, lançado pelo governo no mês passado. César Rômulo da associação das empresas de Telecomunciações (TeleBrasil), criticou o PNBL, argumentando que o governo levou à cabo uma política que não foi aprovada pela Confecom. Franklin Martins rebateu dizendo que as resoluções não são “impositivas”, mas passam por um filtro dentro do governo.

O quinto eixo é a definição de um modelo de regulação para a comunicação pública. Mesmo com a aprovação da Lei que cria a EBC (11.652/2008), diversas resoluções apontaram a necessidade de definir uma normatização que abranja todas as mídias públicas, especialmente no que tange aos mecanismos para a promoção da sua independência. “Em muitos estados, é o palácio do governo que decide o que faz ou que não faz. A discussão não é a ebc. Mas é necessário lei da comunicação pública que fixe, princípios, objetivos”, pontuou Franklin Martins. Também em relação a este tema, Marcelo Bechara destacou ações já tomadas pelo governo, entre elas a liberação de publicidade institucional para TVs educativas estaduais e para canais comunitários.

Conselho e continuidade do diálogo
Não figurou entre os destaques apresentados pelo ministro a implantação do Conselho Nacional de Comunicação, uma das resoluções mais comemoradas pelos movimentos sociais na etapa nacional da Confecom. A medida foi cobrada pela deputada Luiza Erundina (PSB-SP). “O executivo não pode criar o conselho proposto pela Confecom?”, questionou. Na opinião da parlamentar, este seria o espaço para dar continuidade ao diálogo entre os segmentos e para avaliar as estratégias de implementação das resoluções.

Franklin Martins deu uma resposta evasiva, sem apresentar uma projeção para a concretização da proposta. “Se discutir que o marco regulatório deve ter um marco para telecomunicações e outro para radiodifusão? Isso é uma coisa. Se você disser que deve estar tudo junto é outra coisa. Se tiver algum tipo de agência que vá garantir a execução desse marco regulatório, ela será diferente um modelo um do outro. Então não faz sentido começar por isso (Conselho Nacional de Comunicação). Isso é uma conclusão, um coroamento de um processo mais amplo”, defendeu. Mas enfatizou que a Conferência conseguiu construir um ambiente de entendimento que pode ser frutífero para a concretização das propostas prioritárias.

Ao final de mais de 10 exposições, a audiência evidenciou o enorme desafio em sistematizar o conjunto de propostas em uma agenda e depois transformá-la em ações concretas. Se por um lado há uma avaliação positiva sobre o destravamento do debate gerado pela Confecom, por fica a dúvida sobre quais as chances de que os avanços democratizantes aprovados na Confecom se tornem realidade em um cenário de concentração do direito de fala como o existente em nosso país.

terça-feira, 8 de junho de 2010

E a Confecom?

CONFECOM: O que foi feito de suas propostas?


Venicio A. de Lima *

Os porta-vozes da grande mídia parecem temerosos com a possibilidade – que as conferências nacionais oferecem – de maior participação popular na formulação de políticas públicas de setores de direitos fundamentais, incluindo a comunicação. Negam legitimidade ao processo que é acusado de "minar" a democracia representativa.

Chega a ser intrigante a velocidade com que temas de interesse público, sobre os quais se delibera nessas conferências, são omitidos ou desaparecem da agenda de debates no nosso país. As propostas aprovadas na 1ª Conferência Nacional de Comunicação (Confecom), realizada entre 14 e 17 de dezembro de 2009, certamente constituem um caso emblemático.

Enquanto a cada semana pipocam no Rio e/ou São Paulo seminários patrocinados, em sua maioria, pela grande mídia para discutir "as ameaças autoritárias à liberdade de expressão", a Confecom, que envolveu milhares de participantes em todo o país, só entrou na pauta para ser devidamente satanizada. E não se falou mais na implementação de suas decisões.

Propostas "ameaçadoras"
Quais foram, afinal, as propostas que, segundo o Jornal Nacional, teriam levado os empresários de mídia a boicotar a conferência e acabaram sendo aprovadas estabelecendo "uma forma de censurar os órgãos de imprensa, cerceando a liberdade de expressão, o direito à informação e à livre iniciativa, que são todos previstos na Constituição" (ver aqui)?

Para reavivar nossa memória, valho-me de relação feita pelo Coletivo Intervozes e reproduzo abaixo 13 das principais propostas "ameaçadoras" aprovadas pela Confecom:

1. A afirmação da comunicação como direito humano, e o pleito para que esse direito seja incluído na Constituição Federal;

2. A criação de um Conselho Nacional de Comunicação que possa ter caráter de formulação e monitoramento de políticas públicas;

3. O combate à concentração no setor, com a determinação de limites à propriedade horizontal, vertical e cruzada;

4. A garantia de espaço para produção regional e independente;

5. A regulamentação dos sistemas público, privado e estatal de comunicação, que são citados na Constituição Federal mas carecem de definição legal, com reserva de espaço no espectro para cada um destes;

6. O fortalecimento do financiamento do sistema público de comunicação, inclusive por meio de cobrança de contribuição sobre o faturamento comercial das emissoras privadas;

7. A descriminalização da radiodifusão comunitária e a abertura de mais espaço para esse tipo de serviço, hoje confinado a 1/40 avos do espectro;

8. A definição de regras mais democráticas e transparentes para concessões e renovações de outorgas, visando à ampliação da pluralidade e diversidade de conteúdo;

9. A definição do acesso à internet banda larga como direito fundamental e o estabelecimento desse serviço em regime público, que garantiria sua universalização, continuidade e controle de preços;

10. A implementação de instrumentos para avaliar e combater violações de direitos humanos nas comunicações;

11. O combate à discriminação de gênero, orientação sexual, etnia, raça, geração e de credo religioso nos meios de comunicação;

12. A garantia da laicidade na exploração dos serviços de radiodifusão;

13. A proibição de outorgas para políticos em exercício de mandato eletivo.

O que aconteceu?
Decorridos mais de cinco meses do término da Confecom, o que aconteceu com as 672 propostas aprovadas? Até agora, rigorosamente nada.

Entre nós, historicamente tem sido assim. A realização da Confecom provocou reação "barulhenta" na grande mídia, mas corre-se o risco de que seus resultados concretos sejam nulos.

Na hora de transformar proposta em ação, os atores que de facto são determinantes na formulação das políticas públicas do setor de comunicações mostram o tamanho de sua força e os "não-atores" acabam, como sempre, excluídos.

Uma audiência pública sobre o tema deveria se realizar na Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática (CCTCI) da Câmara dos Deputados, na terça-feira (25/5), para tratar do assunto, atendendo a requerimento da deputada Luiza Erundina (PSB-SP). Anuncia-se que foi adiada para o dia 10 de junho. Espera-se que dela resulte uma articulação coordenada dos "não-atores".

Sem pressão da sociedade organizada que luta pelo reconhecimento do direito à comunicação, nem o Legislativo nem o Executivo respeitarão o resultado da Confecom.

* é professor de Ciência Política e Comunicação da UnB (aposentado) e autor, dentre outros, de Liberdade de Expressão vs. Liberdade de Imprensa – Direito à Comunicação e Democracia, Publisher, 2010

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