segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

Confecom e a democracia

Enio Taniguti e José Roberto Mello

A realização da 1ª Conferência Nacional de Comunicação (Confecom) na história desse país, ocorrida entre os dias 14 e 17 de dezembro, revelou que a democracia brasileira vem se consolidando a passos lentos, porém, precisos e consensuados. Nossa história política, econômica e social é baseada na concentração da riqueza e do poder. Esse tipo de lógica construiu um Estado Nacional excludente, antidemocrático e muito pouco transparente.

As reações das populações e setores excluídos ganharam grande impulso com a redemocratização, ocorrida no final da década de 80 do século passado. Daí decorrem vários movimentos, entre eles se destacam a luta contra o grande latifúndio agrário que pautou a criação do Movimento dos Sem Terra; o direito de realizar greves e pela melhoria das condições de trabalho, notadamente comandados pelos metalúrgicos do ABC; e a organização dos movimentos populares pelo acesso aos serviços básicos como saúde e educação nas principais cidades brasileiras.

Porém, nestes anos todos, um grande latifúndio se consolidou e quase passou imune às novas realidades que hoje compõem o cenário político, econômico e social do país. Trata-se do monopólio das comunicações comandado ainda por pouquíssimas famílias em todo o Brasil. Mas nos últimos dez anos, com o advento e a velocidade das novas tecnologias, a rede de propagação de informações e conteúdos vem mudando consideravelmente e, aos poucos, modificando esse quadro.

O acesso à internet tem propiciado novas formatações de opinião que não se baseiam mais nos antigos meios como jornais de grande circulação e das redes de TV. De outro lado, há um crescimento considerável das mídias regionais e institucionais que já conseguem, em muitos casos, realizar uma cobertura que reflita as forças relevantes locais, porém, sem deixar de atender as demandas por informações globais. Ou seja, aos poucos o país também vem mudando a sua concepção de produzir comunicação, mais focado na diversidade cultural, social e política e menos nos interesses de grandes grupos econômicos.

Nesse sentido, os resultados da Confecom, que servirão para projetos tanto do Legislativo quanto do Executivo, foram relevantes e estão sintonizados com essa nova realidade. A aprovação das propostas foram consensuadas por delegados dos poderes públicos, da sociedade civil e do empresariado.

Para o setor público, foi aprovada, entre outros, a regulamentação para garantir que as prefeituras municipais sejam responsáveis pela gestão de um dos canais digitais decorrentes do decreto presidencial 5.580 de 2006. Outro ponto fundamental, e que pode ter aplicação imediata, é a viabilização de canais analógicos existentes, sobretudo nos centros urbanos onde há grande congestionamento de propagação de ondas, como é o caso da região metropolitana de SP, para propiciar a prestação de serviços de radiodifusão pelo sistema público.

Além disso, a Confecom aprovou a criação de Conselhos de Comunicação nos âmbitos federal, estadual e municipal, de caráter paritário com membros eleitos, para acompanhar a execução de políticas públicas de comunicação no que diz respeito à regulação de conteúdos; concessões e mecanismos de distribuição. Outra proposta diz respeito ao financiamento público para incentivos à Educação Profissional que vise à universalização do conhecimento tecnológico para produção de conteúdo nas diversas mídias, bem como a disponibilização de canais comunitários locais, com prioridade ao uso de software livre. Foi definida ainda a criação de um Plano Nacional de Banda Larga, com finalidade de inclusão social.

Portanto, a Confecom não só deixou clara as diversas situações em que se encontram a produção, a distribuição e o financiamento das comunicações no Brasil, mas também a necessidade de se aproveitar as novas oportunidades que se colocam, como a Banda Larga para toda população, bem como a consolidação dos canais digitais, e o aproveitamento das linhas de financiamento voltadas especificamente para o setor, que podem ser via BNDES, Fundos Públicos e também pelo FUST (Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações), principalmente para viabilizar a infraestrutura necessária para a irradiação dos conteúdos.

A região do ABCD por sua vanguarda e pionerismo na busca de soluções que visam à melhoria de qualidade de vida da população, seja no aspecto prático, como no cultural e político, poderá dar um passo decisivo na implantação de algumas propostas aprovadas pela Confecom. O Consórcio Intermunicipal, que logo se tornará de caráter público, poderá aglutinar as iniciativas para que os municípios se preparem para, por exemplo, a criação do canal digital local, que poderá se estabelecer como uma rede regional . Outra discussão é a implantação dos conselhos municipais de comunicação. O que representaria um grande passo para a democratização ao acesso, produção e distribuição dos conteúdos nos sete municípios.

Enio Taniguti e José Roberto Mello; jornalistas, respectivamente, assessor especial de gabinete da prefeitura de Diadema e secretário de comunicação de Mauá, foram delegados pelo ABC na 1ª Confecom.

Boris Casoy é "uma vergonha"

Cai a máscara do âncora da TV Bandeirantes

por Altamiro Borges - de São Paulo

Os lixeiros apenas desejavam um feliz 2010Primeiro vídeo: ao encerrar o Jornal da Band da noite de 31 de dezembro de 2009, dois garis de São Paulo aparecem desejando feliz ano novo ao povo brasileiro. Na sequência, sem perceber o vazamento de áudio, o fascistóide Boris Casoy, âncora da TV Bandeirantes, faz um comentário asqueroso: “Que merda... Dois lixeiros desejando felicidades... do alto de suas vassouras... Dois lixeiros... O mais baixo da escala do trabalho”.

Segundo vídeo: na noite seguinte, o jornalista preconceituoso pede desculpas meio a contragosto: “Ontem, durante o programa, eu disse uma frase infeliz que ofendeu os garis. Eu peço profundas desculpas aos garis e a todos os telespectadores”. Numa entrevista à Folha, porém, Boris Casoy mostra que não se arrependeu da frase e do seu pensamento elitista, mas sim do vazamento. “Foi um erro. Vazou, era intervalo e supostamente os microfones estavam desligados”.

Do CCC à assessoria dos golpistas
Este fato lastimável, que lembra a antena parabólica do ex-ministro de FHC, Rubens Ricupero – outras centenas de comentários de colunistas elitistas da mídia hegemônica infelizmente nunca vieram ao ar –, revela como a imprensa brasileira “é uma vergonha”, para citar o bordão de Boris Casoy, com seu biquinho e seus cacoetes. O episódio também serve para desmascarar de vez este repugnante apresentador, que gosta de posar de jornalista crítico e independente.

A história de Boris Casoy é das mais sombrias. Ele sempre esteve vinculado a grupos de direita e manteve relações com políticos reacionários. Segundo artigo bombástico da revista Cruzeiro, em 1968, o então estudante do Mackenzie teria sido membro do Comando de Caça aos Comunistas (CCC), o grupo fascista que promoveu inúmeros atos terroristas durante a ditadura militar. Casoy nega a sua militância, mas vários historiadores e personagens do período confirmam a denúncia.

Âncora da oposição de direita
Ainda de 1968, o direitista foi nomeado secretário de imprensa de Herbert Levy, então secretário de Agricultura do governo biônico de Abreu Sodré – em plena ditadura. Também foi assessor do ministro da Agricultura do general Garrastazu Médici na fase mais dura das torturas e mortes do regime militar. Em 1974, Casoy ingressou na Folha de S.Paulo e, numa ascensão meteórica, foi promovido a editor-chefe do jornal de Octávio Frias, outro partidário do setor “linha dura” dos generais golpistas. Como âncora de televisão, a sua carreira teve início no SBT, em 1988.

Na seqüência, Casoy foi apresentador do Jornal da Record durante oito anos, até ser demitido em dezembro de 2005. Ressentido, ele declarou à revista IstoÉ que “o governo pressionou a Record [para me demitir]... Foram várias pressões e a final foi do Zé Dirceu”. Na prática, a emissora não teve como sustentar seu discurso raivoso, que transformou o telejornal em palanque da oposição de direita, bombardeando sem piedade o presidente Lula no chamado “escândalo do mensalão”.

Nos bastidores da TV Bandeirantes
Em 2008, Casoy foi contratado pela TV Bandeirantes e manteve suas posições direitistas. Ele é um inimigo declarado dos movimentos grevistas e detesta o MST. Não esconde sua visão elitista contra as políticas sociais do governo Lula e alinha-se sempre com as posições imperialistas dos EUA nas questões da política externa. O vazamento do vídeo em que ofende os garis confirma seu arraigado preconceito contra os trabalhadores e tumultuou os bastidores da TV Bandeirantes.

Entidades sindicais e populares já analisam a possibilidade de ingressar com representação junto à Procuradoria Geral da República. Como ironiza Beto Almeida, presidente da TV Cidade Livre de Brasília, seria saudável o “Boris prestar serviços comunitários por um tempo, varrendo ruas, para ter a oportunidade de fazer algo de útil aos seus semelhantes”. Também é possível acionar o Ministério Público Federal, que tem a função de defender os direitos constitucionais do cidadão junto “aos concessionários e permissionários de serviço público” – como é o caso das TVs.

Na 1ª Conferência Nacional de Comunicação, realizada em dezembro, Walter Ceneviva, Antonio Teles e Frederico Nogueira, entre outros dirigentes da Rede Bandeirantes, participaram de forma democrática dos debates. Bem diferente da postura autoritária das emissoras afiliadas à Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), teleguiadas pela Rede Globo. Apesar das divergências, essa participação foi saudada pelos outros setores sociais presentes ao evento. Um dos pontos polêmicos foi sobre a chamada “liberdade de expressão”. A pergunta que fica é se a deprimente declaração de Boris Casoy faz parte deste “direito absoluto”, quase divino.


Altamiro Borges é jornalista, membro do Comitê Central do PCdoB - Partido Comunista do Brasil autor do livro Sindicalismo, resistência e alternativas (Editora Anita Garibaldi)

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